Eu tinha 18 anos quando Ela perguntou por que havia deixado a última namorada. RespondEu, verdadeiramente, de acordo com sEus princípios, como Ela lhe havia ensinado. Ela perguntou, então, se podia contar pra o Outro-Eu. Eu disse que sim. Hoje ainda não tenho certeza se Eu havia sido ingênuo ou desnecessariamente sincero... Foi mais um de sEus atos heróicos, mas era o maior deles.
Não seriam tempos fáceis. Não foram. Onde estavam os superpoderes quando Ele (o Outro-Eu) levantou a voz pela primeira e praticamente única vez? Eu precisaria tirar forças de algum lugar. Eu não conhecia palavras mágicas que funcionassem. Eu não tinha Shazam, capa, olhar biônico, telecinese, garras de adamantium.
Só restou uma coisa: para se transformar num herói de verdade (o Supeeeer-Eeeeu!), bastava um arqui-inimigo à altura. Um vilão daqueles, uma encarnação do mal, sabe? Só poderia ser Ele, o Outro-Eu! Os novíssimos poderes seriam diretamente proporcionais ao tamanho do inimigo.
Por anos, Super-Eu combateu inimigos nas ruas, no trabalho, e em outros palcos que criara para si. Desfilava suas histórias e músculos com um certo orgulho. "Olhem como fui forte!", esperando ouvir das pessoas "Olhem que destemido! Olhem que especial!". Adorava fazer demonstrações públicas dos seus poderes.
Cansado de carregar o mundo nas costas e de combater o mal, Super-Eu percebera que o fazia por vontade própria. Super-Eu entendeu que, a despeito de ser "Outro", eles tinham o mesmo nome! SuperEu percebeu que o vilão era ele mesmo! (Não o Outro, O VILÃO ERA O PRÓPRIO SuperEu).
Descobrir que o mal habitava, na verdade, dentro dele, tirou-lhe o chão. O que seria de sua reputação sem inimigos?
Tempos depois, atormentado pelas dores, Eu percebera que não precisaria do reconhecimento do seu público cativo. Eu só queria ser visto por Ele, apenas Ele, o Outro. Eu achava que o Outro nunca esteve lá.
Num rasgo de lucidez, Eu recorrera ao Oráculo. E este lhe mostrou imagens de sua vida em que o Outro estava presente. O Outro sempre esteve por perto, ele só não fazia questão de ser visto. Ele era de um outro país, falava outras línguas. Era mais tranquilo. O Outro dizia que não precisava ser visto, nem ser dito. O Outro era para ser sentido. Eu entendera que podia aprender com o Outro a ser sentido. E isso bastou para Eu honrar-lhe a existência.
Fim da fantasia. Morre o vilão, vão-se os poderes. Agora ele é simplesmente "Eu". Não mais "Super". Apenas humano. Não mais "Outro". Apenas um.